A DESCRIÇÃO
A descrição se caracteriza por
ser o “retrato verbal” de pessoas, objetos, cenas ou ambientes. Nela, são
trabalhadas as imagens, o que permite uma visualização do que está sendo
descrito.
Uma boa descrição não deve
resumir-se a uma simples enumeração. É fundamental captar o traço distintivo
que diferencia o ser descrito dos demais.
A descrição de pessoas deve, além dos
traços físicos, ressaltar os traços psicológicos para que se tenha um “retrato”
mais completo da pessoa descrita.
Na prática, é difícil você
encontrar um texto exclusivamente descrito.
O que comumente ocorre são trechos descritivos, inseridos em um texto narrativo
ou dissertativo. Por exemplo, em qualquer romance (que é um texto narrativo por
excelência), você perceberá várias passagens descritivas, seja de
personagens, seja de ambientes.
“ Quando
um homem morre, ele se reintegra em sua respeitabilidade mais autêntica, mesmo
tendo cometido loucuras em sua vida. A morte apaga, com sua mão de ausência, as
manchas do passado e a memória do morto fulge como diamante. Essa,a tese
da família, aplaudida por vizinhos e amigos. Segundo eles, Quincas Berro Dágua,
ao morrer, voltara a ser aquele antigo e respeitável Joaquim Soares da Cunha,
de boa família, exemplar funcionário da Mesa de Rendas Estadual, de passo
medido, barba escanhoda, paletó negro de alpaca, pasta sob o braço, ouvido com
respeito pelos vizinhos, opinando sobre o tempo e a política, jamais visto num
botequim, de cachaça caseira e comedida.” (Amado,
Jorge. A morte e a morte de Quincas Berro Dágua)
A
DESCRIÇÃO SUBJETIVA
Muitas vezes, ao descrever um
ser, não nos limitamos a fornecer ao leitor um retrato exato e fiel. Podemos
passar-lhe um ponto de vista pessoal daquilo que descrevemos, produzindo, dessa
forma, uma descrição subjetiva.
Essa visão pessoal do
personagem, carregada de juízos de valor, não deve ser considerada um
defeito, pois, na descrição, não devemos nos limitar a fornecer ao leitor um
retrato frio e sem vida daquilo que se descreve – se asism fosse, a descrição
seria uma simples fotografia. É necessário, portanto, ir além do simples
retrato, isto é, transmitir ao leitor uma visão pessoal ou uma interpretação a
respeito do que descrevemos.
Ademais, salvo as descrições
técnicas ou científicas, toda descrição revela, em maior ou menor grau, a
impressão que o autor tem daquilo que descreve.
“No fim
da tarde, quando as luzes se na cidade e os homens abandonavam o trabalho, os
quatro amigos mais íntimos de Quincas Berro D’água – Curió, Negro
Pastinha, Cabo Martins e Pé-de-Vento – descima a ladeira do Tabuão em caminho
do quarto do morro. Deve-se dizer, a bem da verdade, que não estavam eles ainda
bêbedos. Haviam tomados seus tragos, sem dúvida, na comoção da notícia, mas o
vermelho dos olhos era devido às lágrimas derramadas, à dor sem medidas, e o
mesmo pode-se afirmar da voz embargada e do passo vacilante. Como reservar-se
completamente lúcido quando morre um amigo de tantos anos, o melhor dos
companheiros, o mais completo vagabundo da Bahia?” (AMADO, Jorge. A morte e a morte de Quincas Berro Dágua)
A
DESCRIÇÃO OBJETIVA
Na descrição objetiva transmite-se uma imagem concreta e precisa do que se
descreve, destacando nitidamente os detalhes característicos, para que a imagem
seja o mais próximo possível da realidade.
Convém lembrar o que antes foi dito: executando as descrições técnicas ou
científicas, é difícil encontrar uma descrição absolutamente objetiva, pois
sempre haverá alguma interferência do autor em relação àquilo que está sendo
descrito. O que vai distinguir uma descrição objetiva de uma descrição
subjetiva é o grau dessa interferência.
Na descrição subjetiva, a interferência do autor é sempre maior e costuma ser
caracterizada pela emissão de juízos de valor. Já na descrição objetiva, o
autor interfere menos, tentando nos passar uma imagem mais próxima ao real,
evitando os julgamentos pessoais.
TANCREDO: O POLÍTICO DA ESPERANÇA
Qualquer pessoa que o visse, quer pessoalmente ou através dos meios de
comunicação, era logo levada a sentir que dele emanava uma serenidade e
autoconfiança próprias daqueles que vivem com sabedoria e dignidade.
De baixa estatura, magro, calvo, tinha a idade de um pai que cada pessoa
gostaria de ter e de quem a nação tanto precisava naquele momento de desamparo.
Seus olhos oblíquos e castanhos transmitiam confiança. O nariz
levemente arrebitado e os lábios finos, em meio ao rosto arredondado,
traçavam o perfil de alguém que sentíamos ter conhecido durante a vida inteira.
Sua voz era doce e ao mesmo tempo dura. Falava e vestia-se como um estadista.
Era um estadista.
Sua característica mais marcante foi, sem dúvida, a ponderação na análise
dos problemas políticos e socioeconômicos. Respeitado em todo o mundo pela
condição de líder preocupado com o destino das futuras gerações, de conhecedor
profundo das questões deste país, colocava sempre o espírito comunitário
acima dos interesses individuais. Seu grande sonho foi provavelmente o de
pôr toda a sua capacidade a serviço da nação brasileira, tão
ameaçada pelas adversidades econômicas e tão abandonada, como sempre fora, por
aqueles que se dizem seus representantes.
Verdadeiro exemplo de homem público, ficará para sempre na memória dos
seus contemporâneos e no registro histórico dos grandes vultos nacionais.
MARIA, MARIA
Quando a vi pela primeira vez praticamente nem a vi. As pessoas,
em sua maioria, não costumam prestar muita atenção às varredoras de rua. Mas
Maria parece não se importar com isso, porque também não presta muita
atenção às pessoas que passam por ela, uma vez que está sempre olhando para
baixo, à procura do que varrer.
É baixa e magra, como convém a
alguém que sempre comeu muito pouco, e sua pele tem a coloração
típica dos que tomam sol, chuva, mormaço, ou qualquer coisa que não se
possa escolher ou evitar. Seus cabelos crespos e negros parece, encolher-se
ainda mais, para não sofrerem a ação do vento impregnado de poeira e poluição.
Olhos amendoados, também negros, sem brilho: inexpressivos. Com certeza
refletem a sensação de que é inútil expressar-se, seja para reclamar de
qualquer coisa. Mas são olhos duros, de quem protesta, pelo silêncio,
contra a dor ou simplesmente contra o peso da rotina fatigante, cumprida à
risca, para ninguém achar defeito. O nariz levemente achatado e os lábios
grossos são a confirmação dos traços da raça. Boca fechada, apesar do muito que
teria a dizer. Fechada, como se recomenda aos que desejam manter o emprego,
ainda que tão árduo.
Maria tem habilidades manuais. Quando criança, queria ser costureira de lindos
vestidos. Agora quer sobreviver de maneira honrada. Seu uniforme de funcionária
da limpeza pública em nada se parece com os vestidos do seu sonho de menina.
Ela deixa agora os sonhos para seus dois filhos, porque é a única coisa que
pode deixar como herança. Isso é o exemplo da sua luta, da sua esperança que
tira do nada.
Exilada em sua própria cidade, pelo tempo que lhe toma o trabalho, quase não vê
a família, mas persiste e, acima de tudo, acredita, pois “quem traz na pele
essa marca, possui a estranha mania de ter fé na vida”.*
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